DESENHANDO A DESORDEM
Experiências e Disrupções na Cidade
Richard Sennet e Pablo Sendra
Prefácio: Leandro Medrano
Tradução: Maria Alice Junqueira Bastos
SINOPSE
Este livro é um manifesto em favor de uma cidade aberta: vibrante, surpreendente, adaptável. Desordenada.
Em 1970, o sociólogo e urbanista Richard Sennett publicou o inovador Os Usos da Desordem, argumentando que o ideal de uma cidade planejada e ordenada era falho e resultava em cidades vazias de vida e com espaços públicos degradados. Cinquenta anos depois, Sennett retorna a essas ideias ainda férteis e, juntamente com o ativista e arquiteto Pablo Sendra, define uma agenda para o design e a ética da Cidade Aberta.
Os espaços públicos de nossas cidades estão sob o cerco de planejadores que respondem às demandas de privatizações, de sistemas de vigilância crescentes, dominados por interesses corporativos, de consumo e da indústria imobiliária.
Nossas ruas estão se tornando cada vez mais sem vida. De um lado, os negócios estão se digitalizando, as lojas de rua, ou sumindo, se limitando a espaços protegidos e controlados de centros de compras, ou se tornando lojas de conveniência, de passagem. A arquitetura tem produzido prédios que interditam a mistura, o encontro, a integração entre o público e o privado, numa sucessão de equipamentos e barreiras hostis ao cidadão não identificado. Uma cidade fechada, opaca, preconceituosa, de passagem, ultraorganizada, ordenada, planejada.
O que fazer? A desordem pode ser projetada? Neste ensaio provocativo, Sendra e Sennett propõem uma reorganização de como pensamos e planejamos a vida social de nossas cidades.
"Infraestruturas da desordem" combinam arquitetura, política, planejamento urbano e ativismo para desenvolver lugares que nutrem em vez de sufocar, unem em vez de dividir, permanecem abertos à mudança em vez de fechados.
Em resumo: uma cidade que funciona bem não é aquela que é perfeitamente planejada, mas aquela que está viva, pulsante com a energia de seus habitantes, mesmo que essa energia às vezes pareça desordenada.
QUARTA-CAPA
Em Os Usos da Desordem, um clássico da sociologia urbana publicado nos anos 1970, Richard Sennett argumentava que a lógica de planejamento e ordenação das cidades modernas gerou um sistema de constituição de espaços estéril e vazio. Propunha, em vez disso, uma “cidade aberta, baseada nos princípios da porosidade do território, da forma incompleta do espaço, que não almeja nunca estar “finalizada”, e no desenvolvimento não linear com uma governança mais horizontal.
Meio século mais tarde, verifica-se uma realidade ainda mais dramática, com uma arquitetura que foi perdendo a conexão com a rua, espaços públicos degradados e abandonados, reformas urbanas que privilegiam a velocidade dos fluxos e os interesses de uma urbanização voltada à reprodução do capital em detrimento da experiência coletiva.
Desenhando a Desordem recupera os conceitos de Sennet a partir de um intenso diálogo com o arquiteto e ativista Pablo Sendra e sua proposta de intervenção baseada no uso das redes de infraestrutura urbana como elemento de “desordem”, propiciando usos coletivos, inesperados e espontâneos dos espaços urbanos como disparadores de atividades e de convivência comunitária sem mediação de grupos de poder.
Um manifesto crítico-prático em favor de uma cidade popular, gregária e aberta.
RICHARD SENNETT
Richard Sennett é um dos pensadores e planejadores urbanos mais renomados do mundo. Seus livros anteriores incluem, além de The Uses of Disorder: Personal Identity and City Life, The Fall of Public Man, Flesh and Stone e Respect, bem como a recente trilogia Homo Faber: The Craftsman, Together, Building and Dwellings. Há décadas, ele assessora programas urbanos para as Nações Unidas. Recebeu os prêmios Hegel e Spinoza, além de um doutorado honorário da Universidade de Cambridge.
PABLO SENDRA
Pablo Sendra é professor de Planejamento e Design Urbano na Bartlett School of Planning, no University College, em Londres. Ele também é cofundador e sócio do escritório de design urbano Lugadero e cofundador da rede CivicWise. Desenvolve projetos de pesquisa-ação e ensino radical em colaboração com grupos comunitários e ativistas em Londres. É coautor (com Daniel Fitzpatrick) de Community-Led Regeneration (2020) e coeditor (com Maria João Pita e Civicwise) de Civic Practices (2017).
URBANIDADES FRATURADAS
Coleção dedicada aos estudos do urbanismo e seus desafios para a criação de cidades mais solidárias e inclusivas, que enriqueçam a vivência pessoal e a convivialidade.
RESENHA DO LIVRO
Este livro pode ser visto como uma conversa contínua e aberta, em vez de uma apresentação estática dos pontos de vista dos autores. Na primeira de suas três partes, Sennett revisita seu primeiro livro, Uses of Disorder: Personal Identity and City Life (Usos da Desordem, Identidade Pessoal e Vida Urbana, de 1970), e suas ideias sobre o design da desordem. Ele discute os méritos da cidade aberta e seus princípios principais: porosidade do território, forma incompleta e desenvolvimento não linear, que permitem que as cidades se tornem democráticas em termos de uma experiência tátil. O livro de Sennett, foi a inspiração para o trabalho de Sendra com ativistas comunitários e autoridades locais, que constitui a segunda parte do livro. A terceira parte é uma conversa entre os dois autores, moderada pelo editor Leo Hollis. Isso resulta em uma leitura muito animada e envolvente.
Quando foi publicado, Uses of Disorder [revisitado aqui pelo autor na primeira parte] logo se tornou uma inspiração para os movimentos sociais da época, especialmente para ativistas que buscavam estilos de vida alternativos por meio da noção de anarquia, diversidade e indisciplina das cidades. Na segunda parte, "Infraestruturas Para a Desordem", Sendra demonstra, por meio de seu trabalho com ativistas no oeste de Londres, como os movimentos sociais evoluíram desde então e como influenciaram prefeitos em Barcelona, Madri, Bogotá e outros lugares, que promoveram maior envolvimento dos cidadãos no planejamento e formas mais horizontais de governança. Concordando com Sennett sobre a tensão criativa entre aqueles dentro e fora das instituições locais, Sendra ilustra, com muitos exemplos práticos, a interação entre redes de base e o que ele chama de municipalismo. Ele destaca, com razão, a contradição entre como projetar a desordem, enquanto o design tende a introduzir ordem no espaço urbano.
Na terceira parte, Sennett aborda “Desfazer e Fazer”. Ele enfatiza a importância da globalização e seu contexto neoliberal, em que o capital busca transformar a cidade em um produto vendável, enquanto na década de 1960, a renovação urbana se concentrava mais na vontade dos planejadores de impor ordem. A abordagem dos autores gira em torno da experimentação em cooperação com os habitantes. Eles preferem encontros casuais à vigilância e ao design que permite interações imprevisíveis, ajudando as pessoas a superar o medo do desconhecido. Eles acreditam que é possível projetar as relações entre a cidade formal (planejada) e a informal (vivida), enquanto as pessoas se tornam competentes para lidar com a indeterminação.
Uma questão fundamental permanece sem resposta: como evitar que as comunidades sejam exclusivas nesses processos? Para Sennett, as pessoas pertencem a uma multiplicidade de comunidades. No entanto, a escala é importante para a identidade das pessoas e também se relaciona a uma escala íntima e mais ampla. No entanto, permanece a questão se o codesign alternativo é capaz de entregar o "inacabável" anunciado sem que as coisas, por meio de leis de planejamento, evoluam.
TRECHOS DO LIVRO
Uma cidade vital e aberta não ocorre naturalmente. Há lugares em que atividades improvisadas e interação social não acontecem porque a rigidez do ambiente urbano impede essa improvisação, e o planejamento para a desordem é necessário.
O caminho de Hegel pelo dilema senhoria-servidão está na declaração que “por meio do trabalho, o servo torna-se consciente do que realmente é”; ao pensar no trabalho em relação a si mesmo, ele pode “descobrir que tem uma mente própria”. Karl Marx usou exatamente essas frases na sua “fenomenologia”. Mas o próprio Hegel, incomodado com uma ênfase na atividade prática no mundo cotidiano, conforme envelhecia e seu pensamento endurecia, passou a colocar uma ênfase crescente em um Estado racional, abrangente e inclusivo para resolver os problemas de senhores servos – a conclusão perversa a que o Hegel mais velho chegou em 1821 em Grundlinien der Philosophie des Rechts (Princípios da Filosofia do Direito)
As cidades em que todos querem morar deveriam ser limpas e seguras, possuír serviços públicos eficientes, ser sustentadas por uma economia dinâmica; deveriam proporcionar estímulo cultural e também fazer o melhor para cicatrizar as divisões de raça, classe e etnia. Essas não são as cidades em que vivemos.
As cidades falham em todos esses aspectos devido à política governamental, às doenças sociais irreparáveis e às forças econômicas para além do controle local. Dessa forma, cada cidade não é dona de si própria. Ainda assim, algo deu errado – radicalmente errado – em nossa concepção do que a própria cidade deveria ser. Imaginar a boa cidade tornou-se ainda mais difícil à medida que o planejamento se tornou legalista e burocrático após a Segunda Guerra Mundial – Paris, em 1960, tinha um livro de regras muito mais grosso do que em 1870 Isso representa um paradoxo.
O planejador de hoje tem um arsenal de ferramentas tecnológicas – da iluminação à construção de pontes e túneis até os materiais para os edifícios – que os urbanistas mesmo há cem anos não podiam sequer imaginar: temos mais recursos para usar do que no passado, mas não os utilizamos muito criativamente.
A infraestrutura não funciona como um todo fixo e estável, mas como a soma de muitas peças que podem ser substituídas, adaptadas e melhoradas, o que permite reparo e manutenção contínuos. Esse “regime associativo” de partes da infraestrutura pode ser explicado por meio da ideia de assemblage, uma ferramenta conceitual que urbanistas críticos usam para entender as relações e interações na cidade.
Quando a infraestrutura funciona como um sistema aberto que pode evoluir organicamente, ela é capaz de trazer à tona muitos dos usos positivos da desordem: espaços urbanos sem funções predeterminadas, nos quais podem surgir atividades imprevisíveis e não planejadas, em que as pessoas aprendem como lidar com a diferença, com situações desconhecidas e inesperadas; lugares que podem se adaptar conforme as interações e as atividades que ocorrem no domínio público.
Para reverter os efeitos isoladores das áreas da cidade que foram projetadas com excesso de ordem, é importante considerar suas relações com as áreas circundantes. No caso dos condomínios suburbanos fechados e isolados, pode ser difícil encontrar pedaços de tecido urbano para estabelecer a relação com o bairro No entanto, há outros casos de áreas urbanas fechadas e monofuncionais, particularmente aquelas no centro da cidade, que têm forte potencial para serem abertas.
No caso de conjuntos habitacionais no centro da cidade, as abordagens para a revitalização, até o momento, envolveram a subdivisão e o fechamento do espaço, o aumento da densidade por meio da adição de mais edifícios, ou sua demolição e renovação. Essas abordagens não criam possibilidades para novas relações, nem abrem os empreendimentos fechados. Para isso, devemos intervir nas margens, ali onde vários lugares isolados se encontram, onde há potencial para interação entre essas áreas urbanas e as pessoas que vivem ali Richard, numa analogia com os ecossistemas naturais, explica esse processo de intervenção nas margens como a transformação das “divisas” fechadas, que são limites sem interação entre os dois lados, em “fronteiras” permeáveis, repletas de trocas.
Projetar tendo a desordem em mente também confronta os problemas da cidade vertical. O surgimento de atividades espontâneas no solo e a maneira em que as pessoas interagem e percebem estranhos é frequentemente mediada pela composição arquitetônica dos edifícios que cercam o espaço, a altura dos edifícios, as atividades que têm lugar nos diferentes pisos, e outras qualidades materiais e sociais da dimensão vertical.
Os arquitetos entendem essa relação entre o nível da rua, o interior do edifício, os diferentes níveis do solo e os elementos verticais do edifício pelo desenho de uma seção vertical. Embora muitos arquitetos comecem a projetar um edifício pela planta baixa, seu projeto também pode começar pelo desenho da seção vertical. Esse é o caso da Biblioteca de Seattle, projetada pelo OMA (Office for Metropolitan Architecture) de Rem Koolhaas. O diagrama que originou o projeto do edifício é um corte, no qual as diferentes atividades estão dispostas verticalmente e a conexão vertical entre esses diferentes programas gera espaços intermediários destinados a atividades públicas.
Pablo Sendra: Um dos esclarecimentos que faço no início do livro é que, quando dizemos projetar para a desordem, não temos uma abordagem pós-modernista do projeto. Este livro não trata de formas desordenadas que sejam uma reação ao modernismo. Estamos falando sobre a construção de infraestruturas nos espaços públicos que podem parecer muito ordenadas; mas o que elas provocam é o que importa: a desordem.
Assim, nesse caso, o que estou propondo é uma infraestrutura da qual as pessoas possam estar mais conscientes, de diferentes maneiras. Uma delas é a forma como a infraestrutura pode ser visualizada – as pessoas podem ver onde estão os canos de água, onde estão os dutos de eletricidade. A outra maneira é uma infraestrutura que seja comum, coletiva, e possa estimular diferentes tipos de negociações. E há exemplos disso em Londres que já estão acontecendo
SUMÁRIO
Prefácio/Apresentação [por Leandro Medrano, professor-titular da FAUUSP]
Introdução
Parte I [por Richard Sennet]
Sociedade Civil
1 A Política da Cidade Oculta
2 Formas Abertas
Parte II [por Pablo Sendra]
Infraestruturas Para a Desordem
3 Do Papel ao Plano
4 Abaixo
Projeto: Infraestrutura Para a Desordem
5 Acima
6 Desordem na Seção Vertical
7 Processo e Fluxo
Parte III
Desfazer e Fazer
Notas
Agradecimentos
FICHA TÉCNICA
Richard Sennet e Pablo Sendra
Prefácio: Leandro Medrano
Tradução: Maria Alice Junqueira Bastos
Coleção: Urbanidades Fraturadas
Assunto: Urbanismo e Arquitetura
Palavras-chave: cidade; espaço público; cidade aberta; convivência; infraestrutura; compartilhamento; coletividade; modernismo; neocapitalismo; capitalismo; desordem; projeto; design; urbanismo; arquitetura
Formato brochura
15,5 x 23 cm
160 páginas
ISBN 978-65-5505-254-1
R$ 74,90
Lançamento 8 agosto 2025
EBOOK
ISBN 978-65-5505-255-8
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