OS CONTOS DE FADA E A ARTE DA SUBVERSÃO:
O GÊNERO CLÁSSICO PARA CRIANÇAS E O PROCESSO CIVILIZADOR
SINOPSE
Os contos de fada tem sido uma das influências culturais e sociais mais importantes na vida das crianças ao longo dos últimos séculos. Mas até este Os Contos de Fadas e a Arte da Subversão: O Gênero Clássico Para Crianças e o Processo Civilizador ser lançado em 1983, pouca atenção tinha sido dada à maneira como os escritores e coletores de contos utilizaram esse gênero tradicional para moldar a vida das crianças – seu comportamento, seus valores e a relação com a sociedade. Como Jack Zipes mostra de forma convincente, os contos de fada sempre constituíram um discurso poderoso, útil para moldar ou desestabilizar atitudes e comportamentos dentro da cultura.
A edição brasileira se baseia na atual edição americana, revisada inteiramente pelo autor que adicionou uma nova introdução, atualizando este título clássico.
QUARTA-CAPA
Sabemos que os contos de fada se originaram de uma longa tradição oral, muitos séculos atrás, mas não sabemos quando ou como essas histórias foram criadas. O fato incontestável é que, hoje, o sucesso que suas versões modernas alcançaram em nossa sociedade, em formato de livro, e mais recentemente, a partir de meados do século XX, em filmes e desenhos animados é incontestável. Em Os Contos de Fada e a Arte da Subversão, Jack Zipes demonstra como desde o início esse sucesso esteve a serviço de um processo civilizador, domesticador, visando incutir na infância a visão de mundo adulta. De Perrault a Disney, literatura e cinema fizeram uso dessas histórias para elaborar discursos sobre costumes, valores e boas maneiras para que crianças e adultos se civilizassem de acordo com o código social de cada época, enquanto, por outro lado, autores como L. Frank Baum (de O Mágico de Oz) e os contraculturais tentaram transformar, subverter esse processo, para fazer com que seus pequenos leitores percebessem os verdadeiros limites e possibilidades de seus desejos pessoais profundos em um contexto social sem príncipes encantados e lobos malvados.
ORELHA
Quem acompanha os estudos sobre literatura infantil certamente não tem como desviar dos subgêneros literários contos de fada e contos maravilhosos. Ainda que o tema, por ser muito sedutor e complexo, congregue uma vasta bibliografia especializada, algumas obras são consideradas pilares para uma compreensão aprofundada dos temas. Nesse sentido, o trabalho intelectual do professor Jack Zipes é ímpar e indispensável.
Em Os Contos de Fada e a Arte da Subversão, pela primeira vez publicado em português, Zipes propõe uma leitura histórica dos subgêneros pelo viés político e social, revelando que esses textos possuem um alto poder de adaptação aos tempos. O olhar inédito de Zipes evidencia que por trás dessa “resistência” temporal dos contos populares estão suas diversas versões escritas por autores comprometidos com um discurso.
Porém, tais recontos, como demonstra Zipes a partir da comparação teórica e textual das versões e de informações sobre os autores e o contexto da época, estão a serviço de uma ideologia e de um tempo histórico. Revestidos de seu caráter universal e, por isso, elásticos no âmbito de sua reescrita, os contos de fada apresentam características formais e literárias que podem ser associadas a um projeto intelectual, seja para defender ou denunciar uma situação de exploração social.
Com isso, o livro de Zipes se torna um incrível passeio pelas diversas versões da mesma obra no eixo horizontal da temporalidade, aliado à leitura vertical profunda e analítica, demonstrando que os contos de fada e populares não são nada ingênuos. Dessa maneira, a obra de Zipes contribui para uma leitura politizada e reveladora dos contos de fada e para um entendimento de como essas narrativas aparentemente singelas detêm um poder sem igual.
AUTOR
Jack Zipes é professor emérito de Alemão, Literatura Comparada e Estudos Culturais da Universidade de Minnesota e um dos maiores estudiosos das origens dos contos populares, de fadas e folclóricos. Tendo lecionado por várias décadas sobre literatura alemã, teoria crítica, cultura judaica alemã, literatura infantil e folclore. Traduziu duas grandes edições dos contos dos irmãos Grimm para o inglês e se concentrou no estudo dos contos de fadas, na sua evolução e no seu papel social e político nos processos civilizatórios, baseando sua abordagem na teoria crítica da Escola de Frankfurt e, mais recentemente, nas teorias da evolução cultural.
DA CAPA
Criação: colagem, por Luisa Moritz Kon
COLEÇÃO IDA E VOLTA
A coleção Ida e Volta se propõe a abrigar obras paradigmáticas do cenário da crítica literária no campo da literatura infantil e juvenil. Reunindo autores nacionais e internacionais, cada livro é selecionado de acordo com a relevância temática e abordagem única de assuntos inéditos ou muito pertinentes para o cenário editorial brasileiro. Voltada para educadores, pesquisadores e amantes da literatura infantil, a coleção vem a somar em um cenário ainda escasso de publicações de peso com o objetivo de enriquecer o debate da área e abrir caminhos para novas pesquisas.
TRECHOS
“Os contos de fada são baseados em uma disposição humana para a ação social – para transformar o mundo e torná-lo mais adaptado às necessidades humanas enquanto nós mesmos tentamos mudar e nos tornar mais adaptados ao mundo. Quase todos os contos de fada têm a ver com uma jornada. Por isso, seu foco, seja de um conto oral, escrito ou cinematográfico, sempre esteve na luta por encontrar instrumentos mágicos, tecnologias extraordinárias e/ou pessoas e animais prestativos que permitirão que os protagonistas transformem a si mesmos e o seu ambiente, e tornem o mundo mais adequado para que se viva em paz e alegria.”
(...)
“Certamente pode-se falar que cada conto de fada para crianças é um ato simbólico impregnado pelo ponto de vista ideológico do autor individual – e aqui é importante acrescentar que os contos de fada para crianças não podem ser separados dos contos de fada para adultos. O gênero se originou a partir de uma tradição de narração oral de histórias e foi criado e cultivado por adultos. Primeiro, os contos de fada se tornaram um gênero literário aceitável entre os adultos e só então se disseminaram em sua forma impressa entre as crianças no século XVIII. Quase todos os críticos que estudaram o surgimento dos contos de fada literários na Europa concordam que escritores instruídos se apropriaram de propósito do folclore oral e o converteram em um tipo de discurso literário sobre costumes, valores e boas maneiras para que crianças e adultos se tornassem civilizados de acordo com o código social da época.”
(...)
“A socialização literária era uma forma de disseminar valores e interesses, e de fortalecer, de maneira subliminar, a influência sobre o processo civilizador. Como a infância se tornou uma fase mais distinguível, como uma fase separada do crescimento, e era considerada como a base crucial para o futuro desenvolvimento da personalidade individual, agora dava-se uma atenção especial às maneiras, roupas, livros, brinquedos e à educação em geral das crianças. Nos séculos XVII e XVIII, surgiram diversos livros, panfletos e brochuras que lidavam com as maneiras à mesa, as funções naturais, a etiqueta no quarto, as relações sexuais e o modo correto de falar.”
(...)
“Aqui precisamos analisar a socialização da leitura de contos de fada com o foco principal naqueles desenvolvidos pelos irmãos Grimm. Ao discutir a socialização, irei me basear na noção geral de cultura que é definida pela maneira como os seres humanos objetificam a si mesmos, reúnem-se e relacionam-se entre si na história, e materializam suas ideias, intenções e soluções, no sentido de torná-las mais concretas. Concretas no sentido de que existem formas que as pessoas criam e usam para fazer com que suas ideias, intenções e soluções se enraízem de uma maneira visível, audível e perceptível, e assim se tornem de fato parte da vida diária das pessoas. Assim, a cultura é vista como um processo histórico de objetificação humana, e o nível e a qualidade de uma cultura nacional dependem da socialização desenvolvida pelos seres humanos para integrar os membros jovens na sociedade e para reforçar as normas e os valores que legitimam os sistemas sociopolíticos e garantem alguma forma de continuidade na sociedade.”
(...)
“Andersen, cuja vaidade era imensa e insaciável, era extremamente sensível a críticas, e sempre reclamava de maneira petulante que se sentia desvalorizado na Dinamarca, enquanto outros países europeus reconheciam a sua genialidade. Tal tratamento em casa, apesar de ele se considerar o serviçal mais leal, seja realidade ou projeção, ficou simbolizado nesse conto. A referência às “plantas comuns” que o jardineiro cultiva está ligada aos temas populares e aos objetos cotidianos que ele empregou e aprimorou para que pudessem florescer esteticamente em seu próprio solo. Andersen se orgulhava de que ele, o jardineiro, tinha tornado a Dinamarca famosa, pois tiravam fotos de seu jardim e elas circulavam pelo mundo. No entanto, o jardineiro trabalha nos limites da servidão e do patronato, e a voz dominada do narrador, apesar de irônica, racionaliza a maneira humilhante como os senhores tratam Larsen: eles são pessoas “decentes”. Mas pode-se pensar – e a tensão do discurso nos leva a isso –, se o jardineiro é incrível e brilhante, por que ele não se rebela e pede demissão? Por que o jardineiro sofre tal humilhação e dominação? Por que ele não emigra?”
(...)
“Em resumo, o perigo no círculo íntimo e a segurança na natureza e do universo são formas especiais de interdependência e isolamento nas quais podem ser vistos os padrões básicos da imagem da humanidade nos contos de fada. E a intensificação das tensões familiares a ponto de se chegar à morte não deve ser interpretada apenas do ponto de vista psicológico e antropológico. Tal intensificação é característica do estilo do conto de fada, que busca ir a todos os extremos na representação da beleza e da recompensa, assim como na representação do crime e da punição.”
(...)
“Mas o filme de Disney também é um ataque à tradição literária dos contos de fada. Ele rouba a voz do conto literário e muda a sua forma e o seu significado. Como a mídia cinemática é uma forma popular de expressão e é acessível ao público em geral, Disney na verdade retoma o conto de fada para a maioria das pessoas. As imagens (cenas, quadros, personagens, gestos, piadas) são facilmente compreensíveis por jovens e adultos de diferentes classes sociais. Na verdade, o conto de fada é praticamente infantilizado, assim como as piadas são infantis. O enredo registra o desejo edipiano mais profundo de todo menino: o filho humilha e diminui o pai e foge com seu objeto de amor mais valioso, a filha ou a esposa. Ao simplificar esse enredo completo de maneira semiótica em desenhos em preto e branco, e ao zombar disso de maneira a ter um apelo comum, Disney também tocou em outros temas como democracia, tecnologia e modernidade. Mas naquela altura de sua vida, ele não se deu conta do potencial do cinema para desenvolver a sua missão civilizadora. Quando jovem, ele foi muito influenciado pelo populismo e celebrava o individualismo. Ele estava principalmente preocupado em focar nos excluídos; em especial, nas pessoas pequenas, muitas vezes antropomorfizadas em animais, que eram oprimidas, revelavam grande coragem e conseguiam se salvar graças a seus próprios esforços.”
SUMÁRIO
Introdução à Terceira Edição
Prefácio da Segunda Edição
1. O Discurso dos Contos de Fada: Em Direção a uma História Social do Gênero
2. As Origens dos Contos de Fada na Itália: Straparola e Basile
3. Estabelecendo Padrões Para a Civilização Por Meio dos Contos de Fada: Charles Perrault e o Papel Subversivo das Escritoras
4. Quem Tem Medo dos Irmãos Grimm? Socialização e Politização Por Meio dos Contos de Fada
5. Hans Christian Andersen e o Discurso do Dominado
6. Inverter e Subverter o Mundo Com Esperança: Os Contos de Fada de George Macdonald, Oscar Wilde e L. Frank Baum
7. A Disputa Sobre o Discurso dos Contos de Fada: Família, Fricção e Socialização Durante a República de Weimar e na Alemanha Nazista
8. O Potencial Libertador do Fantástico nos Contos de Fada Contemporâneos Para Crianças
9. A Missão Civilizadora de Walt Disney: Da Revolução à Restauração
Bibliografia
Índice
Agradecimentos
FICHA TÉCNICA
Autor: Jack Zipes
Tradução: Camila Werner
Coleção Ida e Volta [IV.02]
Literatura
Impresso em brochura
13,5 x 22,5 cm
352 páginas
ISBN 978-65-5505-166-7
Lançamento 12 out
EBOOK
ISBN 978-65-5505-167-4
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